Falar sobre saúde mental é o melhor caminho para ampliar a autoconsciência e combater o estigma em torno do tema. É o caso da animação Divertida Mente 2, que traz diferentes perspectivas sobre a natureza da nossa estrutura emocional e introduz novas personagens que materializam novas emoções.
A narrativa gira em torno do desenvolvimento da protagonista, Riley, que vive novos dilemas e conflitos aos 13 anos de idade. Nos primeiros minutos, o filme retrata a explosão de emoções típicas da adolescência.
A psicóloga Lisa Damour, uma das consultoras técnicas de Divertida Mente 2, afirma, em entrevista ao jornal The New York Times, que “mesmo as emoções menos agradáveis podem ajudar a nos manter seguros e a nos guiar”. Ela prossegue: “na nossa cultura, muitas vezes somos levados a pensar que precisamos nos sentir bem sempre. Mas a saúde mental é muito mais do que isso, é ter sentimentos que traduzem o que se passa em nossa vida e saber manejá-los da melhor maneira”.
As emoções representadas na produção original – Alegria, Tristeza, Raiva, Medo e Nojo – ganham uma nova dinâmica com a chegada da Vergonha, Inveja, Tédio e Ansiedade. Além da nostalgia, que faz uma “ponta” na história e completa o time que comanda os pensamentos e comportamentos da garota.
O processo de seleção das emoções foi criterioso e se baseou no momento de vida de Riley. “Nessa idade, você se torna autoconsciente e passa a ser mais independente. Esse processo faz a gente se preocupar sobre o que os outros pensam a nosso respeito. Será que vou me encaixar? Eles gostam de mim? Existe um medo de ser deixado de lado nessa fase e esse medo é algo com que devemos aprender a lidar pelo resto da vida”, aponta Kelsey Mann, diretor do longa, em entrevista ao portal CBR. “Um desafio em lidar com as emoções é dar nome a elas. Quando as reconhecemos e as enxergamos, a intensidade pode baixar um pouco”, destaca.
A equipe de criação da Disney retratou cuidadosamente cada uma dessas emoções. Cada detalhe foi desenhado, juntamente com uma equipe de especialistas em saúde mental, dando forma ao que sentimos com uma linguagem lúdica e “quebrando tabus”. Vejam algumas dessas sutilezas:
Cada personagem é representado por uma cor específica que representa aquele estado emocional, mas cada um tem detalhes em outras cores, demonstrando que as emoções não são isoladas e se misturam.
Personagens como a Ansiedade e a Raiva, não têm nariz. Será porque são emoções que, muitas vezes, nos tiram a capacidade de respirar?
Na cena em que as personagens estão dormindo em seus quartos, se tivermos atenção, podemos observar uma caixa de lencinhos de papel para enxugar as lágrimas da Tristeza, muitas luzes noturnas compõem a parede do quarto do Medo, que dorme com seu ursinho de pelúcia, enquanto a Raiva conta com um extintor de incêndios ao lado de sua cama.
Ansiedade: mocinha ou vilã?
Embora cada emoção tenha seu papel na trama (e na vida), quem rouba a cena em Divertida Mente 2 é a Ansiedade. A espevitada chega como um verdadeiro furacão à vida de Riley – cheia de vontade, logo toma o controle e impõe novos desafios a toda a equipe de emoções. Em sua primeira aparição, a Ansiedade traz várias malas, que representam o fardo que carrega por imaginar tantas situações. Ela se apresenta como a grande responsável pelo planejamento do que está por vir.
Deanna Marsigliese, diretora de arte da Pixar e responsável por conceituar e desenhar as emoções, teve um cuidado especial com a Ansiedade. “Ela tem como característica marcante as nuances de movimento inspiradas em uma chaleira. É alguém com uma fervura implacável de energia nervosa logo abaixo da superfície. Como o vapor em uma chaleira, esta energia nervosa escapa de várias maneiras: a Ansiedade treme, se contorce e se contrai. Ela tem muita tensão naquele corpinho”, explica a designer em seu perfil no Instagram.
Assim, a narrativa expõe a natureza desta emoção que antecipa os cenários futuros – porém, muitas vezes, projeta situações negativas às quais ela tenta prevenir desesperadamente. Dessa forma, quando não balanceada, a ansiedade acaba minando nosso equilíbrio emocional e assim acontece na vida de Riley.
Esse cuidado nos detalhes estéticos torna a Ansiedade ainda mais marcante dentro do filme e reforça o impacto das suas ações. Temas como perfeccionismo e egoísmo surgem à medida que os planos da Ansiedade são levados adiante. A emoção que toma conta de Riley leva a adolescente a tomar decisões moralmente incorretas. Inclusive a construção de valores e convicções é um ponto importante do enredo, com as emoções antigas batalhando para que Riley não abandone os valores consolidados em sua mente.
No entanto, a Ansiedade que poderia ser considerada a vilã do filme, age por amor à Riley, acreditando que é a mais capacitada para a posição de comando da vida da jovem, a exemplo do que fazia a Alegria na primeira edição. Mas suas ações orientadas por cenários futuros negativos, que na maior parte das vezes nunca irão acontecer, levam a resultados desastrosos.
De fato, quando exacerbada, a ansiedade pode gerar preocupações excessivas e interpretações distorcidas que nos levam a acreditar que não daremos conta. Alguns pensamentos comuns são: “Não vai dar tempo!”, “Estão me julgando”, “Não me preparei o suficiente”. Desconfie quando se sentir dessa forma e lembre-se que as emoções são passageiras.
Dacher Keltner, outro psicólogo que participou do desenvolvimento do longa, enxerga o filme como “um chamado para que sejamos mais suaves com nós mesmos”. Ele declarou, também em entrevista ao The New York Times, que “as pessoas tendem a se colocar em caixinhas, mas nós somos muitas coisas e os jovens devem abraçar essa noção, saborear as coisas boas e aceitar a nossa complexidade”.
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