A infância é uma das fases mais importantes da vida. É nela que desenvolvemos nossa estrutura mental, e são os primeiros anos que servem de base para todas as aquisições que o cérebro fará no futuro. Embora ninguém consiga passar pela infância sem vivenciar experiências adversas ou ruins, é a ocorrência sucessiva e frequente dessas situações, que, a longo prazo, podem atrapalhar o desenvolvimento do cérebro e prejudicar não só a adolescência, mas também a vida adulta.
Em 2021, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em parceria com o instituto Gallup, publicou o relatório “Situação Mundial da Infância”. Segundo os dados, pelo menos uma a cada sete crianças e jovens entre 10 e 19 anos convive com algum transtorno mental diagnosticado. Entre os mais comuns está o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), que atinge de 3% a 5% das crianças em todo o mundo, segundo dados da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA).
Os dados nos mostram como é importante nos atentarmos para os cuidados com a mente desde cedo, pois o diagnóstico precoce e o encaminhamento adequado dos casos leva qualidade de vida para essas crianças e jovens hoje e no futuro. E, como podemos proteger a saúde mental dos pequenos para que possam atingir seus potenciais e aproveitarem a vida?
A importância do brincar para a saúde mental na infância
Brincar está entre as práticas mais importantes para a saúde mental infantil e é responsável por diversos benefícios. Dentre eles, estão a consciência corporal e o desempenho físico, que contribuem para o melhor desenvolvimento motor, e o favorecimento do raciocínio, da criatividade e da imaginação. As brincadeiras em grupo facilitam o convívio social, contribuindo para que as crianças entendam regras e os limites das relações, além de conviverem com a diversidade de pensamentos.
As interações que acontecem durante as brincadeiras, estimulam a liberação de neurotransmissores que promovem a sensação de bem-estar e diminuem o estresse. Também desempenham o papel de apoiar a organização das redes neurais das crianças, ou seja: quanto mais interações ela tem, mais habilidades ganhará, facilitando e melhorando suas relações.
Disciplina positiva
Uma metodologia benéfica para a saúde mental na infância é a da disciplina positiva. Ela gira em torno de criar relações harmoniosas por meio do afeto, da empatia e da firmeza, abrindo mão de uma cultura autoritária – que utiliza castigos, gritos e palmadas – para criar adultos mais colaborativos, responsáveis, empáticos, amorosos e seguros de si. Inspirada pelos pensamentos dos psicólogos Rudolf Dreikurs e Alfred Adler e esquematizada por Jane Nelsen na década de 80, a ideia promove uma maneira não violenta de criar os filhos e possui cinco pilares principais para saúde mental na infância:
Respeito mútuo – parte do princípio de ser firme e gentil ao mesmo tempo. Ao praticar a empatia com a criança, colocando-se no lugar dela, conseguimos reconhecê-la como um indivíduo único e acolhê-la; ao mesmo tempo, a firmeza afasta a ideia de permissividade e faz com que tenhamos autoridade sem sermos autoritários.
Conexão forte – trabalha a ideia de importância e pertencimento. Ao trazermos as crianças para perto, escutando-as e incluindo-as em decisões do dia a dia, fazemos com que elas se sintam parte da família e, além de estreitar laços afetivos, contribuímos com a criação de um senso de responsabilidade.
Ser eficaz a longo prazo – não pensar apenas em uma educação pontual, mas sim no desenvolvimento de um adulto mentalmente saudável. A metodologia punitiva, adotada por muitas famílias, é acompanhada da falsa ilusão de corrigir comportamentos; no entanto, a prática contribui para a criação de sentimentos negativos, tais como medo, insegurança e raiva. Já a disciplina positiva foca em um acompanhamento de acordos e limites estabelecidos entre os pais e as crianças, fazendo com que os pequenos busquem refletir sobre os motivos reais por trás de seus comportamentos, influenciando no autoconhecimento e no autocontrole a longo prazo.
Desenvolvimento de habilidades socioemocionais – o ser humano possui uma tendência de repetir comportamentos e hábitos que lhe foram ensinados. Partindo desse princípio, uma criança que cresceu num ambiente hostil e baseado em castigos poderá repetir o padrão de sua criação em suas relações futuras. Ao utilizarmos uma comunicação não violenta e focada no respeito, na gentileza e na empatia, ajudamos a criar cidadãos mais felizes e colaborativos, que pensem mais no próprio bem e no da comunidade em que estão inseridos.
Desenvolvimento de capacidades pessoais – estimula a criança a descobrir suas habilidades e seus limites através do autoconhecimento. Em vez de ver o erro como algo negativo, a disciplina positiva designa o erro como uma oportunidade de aprendizado e evolução, estimulando a autoconfiança, a autoestima e a autonomia.